A formatação da Bíblia.
Não
creio que muitos cristãos conheçam por quem, como, de que maneira, as Sagradas
Escrituras chegaram até os nosso dias.
Vou
dar uma rápido esclarecimento, uma resenha, um panorama, sobre a formatação da
Bíblia.
Paris da Idade Media
Estamos
tratando aqui da Europa, e da Cultura Ocidental Judaico-cristã.
Com
a Queda do Império Romano do Ocidente e as invasões, ou migrações, dos
denominados ‘povos bárbaros’ ( povos germânicos, como os godos, os ostrogodos,
os visigodos, os celtas, os gauleses, etc.) surgiu o feudalismo, um novo
sistema econômico, político e social.
A
sociedade feudal era estática (com pouca mobilidade social) e hierarquizada
1-
A nobreza feudal (senhores
dos reinos, principados, ducados, margraviatos, condados, baronatos, senhorios,
sem esquecer a classe dos cavaleiros e
ou guerreiros ) era detentora de terras;
2-
O clero (Papa,
cardeais, bispos, abades, monges, padres, enfim os membros da Igreja Católica) poderosíssimo
já que era responsável pela proteção espiritual de uma sociedade mística, cheia
de crendices , repleta de superstições, com influência direta de deuses pagãos;
3-
Os artesãos e os
camponeses livres;
4-
Os servos da
gleba - vinculados à terra e constituíam a mais baixa classe social da
sociedade feudal, ligeiramente mais livres que os escravo;
5-
Os escravos.
Todos
ligados pelo sistema de vassalagem ou suserania
- relação de obediência que o
vassalo deveria manter em relação ao senhor feudal- o rei era senhor dos nobres, o nobre era senhor de outros
nobres, e assim por diante.
A
grande disputa sempre foi entre o Papa de Roma e os outros senhores feudais, já
que o romano pontífice exigia a suserania de toda a cristandade.
Desde
Clovis I, rei dos francos desde 481, sendo batizado no dia de Natal de 508, pelas
mãos de São Remi , o bispo de Reims, junto com 3.000 guerreiros, “o soberano passaram
europeus passaram a reinar em nome de Deus, estabelecendo assim sua autoridade
sobre as populações que ele domina, contando com o apoio do clero , e vice-versa”.
No
vice-versa a Igreja de Roma impôs a
todos feudos - os reinos, principados, ducados, margraviatos, condados,
baronatos, cidades livres, domínios, abadias, mosteiros, literatos, eruditos,
estudiosos, o mundo acadêmico - trabalhos teológicos, literários, filosóficos -
o direito, as jurisprudências, os livros, manifestos, etc. e tal - o seu latim
, “ uma antiga língua indo-europeia do ramo itálico originalmente falada no Lácio,
região histórica da Itália Central, onde a cidade de Roma foi fundada”.
“
No soneto “Língua Portuguesa”, o poeta brasileiro Olavo Bilac (1865-1918)
escreve no primeiro verso “Última flor do Lácio, inculta e bela”, se referindo
ao idioma Português como a última língua derivada do Latim Vulgar falado no
Lácio, uma região italiana”
Soneto "Língua Portuguesa" de Olavo Bilac
Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...
Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!
Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,
Em que da voz materna ouvi: "meu filho!",
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!
Essa
imposição da Igreja de Roma mal comparado o latim é o inglês de hoje para as
relações internacionais.
Mas
é claro que cada região possuía um linguajar , as variantes das línguas
indo-europeias, exemplifico as línguas itálicas, celta, germânicas, etc.,
contudo com a expansão do Império Romano o chamado ‘latim vulgar’ ( a língua
coloquial usada por diferentes camadas da população romana, desde a
aristocracia até o povo iletrado, como uma espécie de denominador comum, sendo
o instrumento de comunicação diária ) falando pela soldadesca e afins foi
misturado com as nativas e dessa mistura nasceu “ o italiano, francês,
espanhol, português, romeno, catalão, romanche ( uma das quatro línguas
nacionais da Suíça, juntamente com a língua alemã, a língua italiana e a língua
francesa) e outros idiomas e dialetos regionais da área’ de nossos dias.
Uma
curiosidade: Na França o sistema feudal de organização social e política só foi
abolida em tempos da Revolução Francesa de 1789.
No
hoje território da França se falava o gaulês ( gálico) , além dos dialetos como o bretão do ducado da Bretanha, o Langue
d'oïl ao norte, nas Ilhas do Canal , occitânico-romano do sul, a langue d'oc, o
vulgaris ( fala popular), um latim vulgar, um latim popular.
Só
com Francisco I, Rei da França de 1 de janeiro de 1515 a 31 de março de 1547, por 32 anos, 2 meses e 30
dias, é que o francês se torna língua
oficial do reino, através de L'ordonnance d'août 1539 sur le fait de la
justice, dite l'ordonnancenote de Villers-Cotterêts, aussi appelée l'ordonnance
Guilelmine -
T.L.:
A portaria de agosto de 1539 sobre o fato da justiça, conhecida como a portaria
de Villers-Cotterêts, também chamada de Ordenança Guilelmine-registrada no
Parlamento de Paris em 6 de setembro de 1539, sendo o mais antigo ato
legislativo ainda vigente na França.
Mesmo
assim os dialetos ou les langues maternelles du royaume continuaram a existir
sendo seus usos proibidos somente por decreto de 2 Thermidor Ano II (20 de
Julho de 1794) impondo o francês como a única língua de toda a Nação, de toda a
administração.
Porque
escrevi o acima?
Para
o leitor entender que as publicações
eram feitas em latim, e tem mais não no vulgaris, na fala popular, mas no latim
erudito.
Blason de la commune de Saint-Chef
Brasão de
Saint-Cher
Saint-Cher,
hoje Saint-Chef, uma comuna francesa situada no norte do departamento de Isère,
Região Auvergne-Rhône-Alpes, essa localizado na parte central e oriental do sul
da França.
Em
1200, o último ano do século XII, nasceu Hugues, e eu não tenho a menor ideia
se sua família era nobre, burguesa em ascensão, artesões, ou comum, mas sei que
ele fez seus estudo primários com os padres da
Abadia-igreja de Saint Theudère, perto, de sua casa.
Como
era um prodígio e amante dos estudo foi enviado aos 15 anos para Universidade
de Paris, L’université de Paris, ou seja, la Sorbonne, estudou filosofia,
teologia e jurisprudência, para depois lecionar essa última matéria na própria
Sorbonne.
Seu
nome aportuguesado é Hugo de Saint-Cher.
Vejam
o Saint-Cher não era porque sua família detinha o domínio de Saint-Cher, mas,
sim porque ele nasceu na localidade.
A
partir de 1218 morou no recém fundado convento dos jacobinos da rua de
Saint-Jacques (daí o nome jacobinos atribuídos aos dominicanos na França, pois Jacques
é Jacobus em latim. Em português é São
Tiago), localizado na margem esquerda do Sena.
Com
25 anos tomou o hábito dominicano e em 1226 foi nomeado Prior Provincial da
Ordem da França.
Em
1230, já Mestre de Teologia, foi escolhido Prior do Convento de Paris.
Nota: A Ordem dos Pregadores (latim: Ordo
Prædicatorum, O. P.), ou Ordem de São Domingos, ou Ordem Dominicana, foi
fundada em Toulouse, França, em 22 de dezembro de 1216 por São Domingos de
Gusmão, um sacerdote nascido em Castela, atual Espanha, e confirmada pelo Papa
Honório III, nascido Cencio Savelli, um italiano de Albano, no Lazio, Itália.
Hugues
de Saint-Cher era incansável em seu
trabalho em prol da Ordem Dominicana chamou atenção por seu esforço e trabalho
Hughes Cardeal de Saint-Cher
Na primeira representação de óculos da História da
Arte
Cardeal presbítero
de Santa Sabina
Príncipe da Igreja de Roma
Da série dos quarenta dominicanos famosos de 1352, no antigo
convento de São Nicolau, Sala do Capitólio, Treviso, Itália
cada retrato de 150 cm.
Agora
já era Hugues de Saint-Cher, em latim, Hugonis de Sancto Charo, e veio a
aprovação do Papa Gregorio IX na forma de sua nomeação para o delicado cargo de
Legado Papal, ou seja, representante pessoal do Papa junto ao Basileu
(Βασιλεύς) João III Ducas Vatatzes, imperador bizantino que reinou em Niceia de
1221 até 1254.
Nota: “O Império de Niceia (em grego: Βασίλειον τῆς Νίκαιας; em turco: İznik İmparatorluğu) foi o maior
dos estados bizantinos grego fundado pela nobreza exilada do Império Bizantino
após a tomada de Constantinopla pelos cruzados durante a Quarta Cruzada. Durou
de 1204 a 1261 e sua capital era a cidade de Niceia, atual İznik, uma cidade
situada na região de Mármara, província de Bursa, Turquia.
Inocêncio
IV o elevou a Cardeal com o título de Cardeal Presbítero de Santa Sabina em 1244,
‘titulus’ ligado a Basílica de Santa Sabina, (Basilica Sanctae Sabinae,
Basilica di Santa Sabina all'Aventino) localizada no Monte Aventino (rione
Ripa), em Roma, Itália.
Sendo
que Santa Sabina é, também, um Basílica Menor e igreja mãe da Ordem dos Dominicanos.
O
Papa Alessandro IV o nomeou Cardeal Bispo de Óstia em dezembro de 1261, contudo
Hugues renunciou alguns meses depois, permanecendo como Cardeal Sacerdote de
Santa Sabina até a sua morte em Orvieto, hoje província de Terni, região da
Umbria, centro da península italiana, em 19 de março de 1263.
Sobre
Hugues:
Chefiando
os trabalhos de um grupo de estudiosos aplicou um Correctorium, na tentativa de
restaurar o texto primitivo da Vulgata latina, removendo suas glosas (notas
explicativas e comentários realizados através dos tempos) e todos os acréscimos
estrangeiros.
Não
recorreu aos manuscritos de São Jerônimo e sim as leituras originais hebraicas
e gregas, fornecendo assim uma nova versão e não uma correção. “Desse trabalho
intitulado Correctio Biblie, sobrevive mais de uma dúzia de manuscritos”.
Com
a ajuda dos Dominicanos, Hugues organizou a primeira Concordância da Bíblia
(Concordantiae Sacrorum Bibliorum ou Concordantiae S. Jacobi).
Entretanto
é falsa a afirmação que foi ele quem dividiu a Bíblia em capítulos, no ano de
1250, como conhecemos hoje, pois ele somente aperfeiçoou a divisão seguindo a
formula como já era realizada - classicamente, os pergaminhos dos livros da
Bíblia sempre foram divididos por espaços em branco no final (petuhoth) ou meio
(setumoth) das linhas- o que não deixou
de ser um avanço.
O
Cardeal Hugues fez um comentário no Quattro Libri delle Sentenze (Libri
Quattuor Sententiarum o Sententiae) de Pietro Lombardo, ou Pier Lombardo, um
teólogo italiano.
O
Livro, que é um Tratado de Teologia, “ na realidade é uma coleção de teologia
sistemática, escrito por volta de 1150 ”.
Referência: Teologia Sistemática- a palavra “teologia”
vem de duas palavras gregas que significam “Deus” e “palavra”. Combinadas,
temos a palavra “teologia”, que significa “estudo de Deus”. A palavra
“sistemática” se refere a algo que colocamos em um sistema. Teologia
sistemática é, então, a divisão da Teologia em sistemas que explicam suas
várias áreas – Fonte: www.gotquestions.org/
Hugues,
o Cardeal Presbítero de Santa Sabina, escreveu “Postillae em sacram scripturam
juxta quadruplicem sensum, litteralem, allegoricum, anagogicum et moralem”,
publicado nos séculos 15 e 16.
De
“ seus sermões - Sermones de tempore et
sanctis- são poucas as anotações.
Suas
obras exegéticas – “ In universum Vetus et Novum Testamentum” - foram
publicadas em Veneza em 1732 em oito volumes.
Mas,
nem tudo são flores em relação a obra de Hugonis de Sancto Charo.
William
de La Mare, um teólogo franciscano inglês, graduado maître régent (magister
regis) na L'université de Paris, la
Sorbonne, entre 1274-1275, que escreveu
Correctio textus bibliae, uma serie de notas acadêmicas relativas a textos
bíblicos, incluindo suas notas textuais, um trabalho baseado no hebraico usado
na versão original da escritura bíblica (The hebraeis et graecis vocabulis
glossarum bibliae ), que compôs uma obra sobre Tomás de Aquino , o Correctorium
ou Reprehensorium, que escreveu, também comentários Sententiae de Pietro
Lombardo, criticou veementemente o Correctorium realizado aos auspícios de
Hugues de Saint-Cher.
O
Correctorium realizado aos auspícios de Hugues de Saint-Cher, também, foi
severamente criticado por Stephen Langton, inglês, Cardeal Presbítero de San
Crisogono (1206-1228), Arcebispo de Canterbury- Arcebispo da Cantuária- (1207
-1228), um escritor prolífico, linguista consagrado, comentarista de quase
todos os livros do Antigo Testamento, pregador eminente tanto que muitos de
seus sermões, são preservados em manuscrito no Palácio de Lambeth, nas
Universidades de Oxford e Cambridge.
Nota: Lambeth Palace (Palácio de Lambeth) é a
residência oficial em Londres do Arcebispo de Canterbury (Arcebispo da
Cantuária). Fica localizado em Lambeth, na margem sul do Rio Tamisa, a curta
distância do Palace of Westminster, situado na margem oposta. Foi adquirido
pelo arcebispado por volta do ano 1200.
Stephen
Langton foi quem dividiu a Bíblia em capítulos como hoje conhecemos, e usamos.
O
Cardeal Langton foi um líder importantíssimo na luta contra o despótico João
Sem-Terra, Rei da Inglaterra, e graças a sua liderança enérgica e a força
militar dos Barões Ingleses esse destrambelhado soberano, um vencido de
nascença, pois perdeu o Ducado da Normandia e outros domínios para o Rei Filipe
II de França, foi obrigado a aceitar, em 15 de junho de 1215, na Magna Carta, o
primeiro passo na evolução da constituição da Inglaterra e posteriormente do Reino
Unido.
“
De grande importância na história eclesiástica da Inglaterra foi o Conselho de Osney
em 17 de abril de 1222 que Stephen abriu em.
Seus decretos, conhecidos como as Constituições de Stephen Langton, são
os primeiros cânones provinciais que ainda são reconhecidos como vinculantes
nos tribunais da igreja inglesa. ”
O
Cardeal Langton, Arcebispo de Canterbury, faleceu em Slindon, perto de
Chichester, Sussex, em 9 de julho de 1228.
Está
sepultado na Catedral de Canterbury - Catedral e Igreja Metropolitana de Cristo
em Canterbury- na St Michael's Chapel,
que agora é a Buffs Regimental Chapel, Capela Regimental de Buffs - Royal East
Kent Regiment ("The Buffs"), 3rd Regiment of Foot, regimento de
infantería de linha do Exército britânico tradicionalmente criado no condado
inglês de Kent que guarnece com soldados a Canterbury.
The
Buffs embarcou para Portugal em agosto de 1808 para lutar na Guerra Peninsular,
que ocorreu de 2 de maio de 1808 até 17 de abril de 1814 contra Napoleão
Bonaparte, que havia invadido a Península Ibérica.
A
atuação dos Buffs foi de vital importância para a reconquista de nosso querido
Portugal.
E
assim se conta a História da formatação da Bíblia.
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